Labor

Paul Vanouse

PT//

A que cheira a exploração laboral? O projeto “Labor” é uma instalação que enche uma galeria com a manifestação visual do odor de pessoas que se exercitam sob stress.

Este projeto reflete e questiona poeticamente a mudança na sociedade industrial, do trabalho humano e mecânico para formas cada vez mais difundidas de produção microbiana, e assim contemplar os contornos, sempre em mudança, que definem o ser humano.

O cheiro do suor é, literalmente, o cheiro de duas espécies de bactérias que se alimentam das excreções do corpo humano e que produzem os aromas acres e azedos que nos são familiares. Neste sentido, o odor do trabalho não é realmente um cheiro humano, a menos que estejamos dispostos a redefinir o que constitui um ser humano.

Isto pode ser chocante, já que a maioria das pessoas pensa que o seu cheiro faz parte de sua própria condição natural – ou seja que o seu cheiro é o seu cheiro. Mas, de facto, é muito mais complexo: o responsável pela determinação desta característica “humana” bastante distintiva é um cocktail de micro-organismos que habita os nossos corpos. Mas é sem dúvida mais do que o nosso cheiro que está em jogo: um estudo recente determinou que “em média, qualquer pessoa tem 182 espécies de bactérias, em qualquer altura, a viver nos seus antebraços, e cerca de 8% delas nunca foram formalmente identificadas por cientistas.”(The Independent, 2007).

Estas descobertas sobre o grande número de criaturas que vivem nos nossos corpos perturbam qualquer conceito reduzido de humanidade, uma vez que estas células são muito mais abundantes do que as células humanas e diferem de pessoa para pessoa, muito mais do que as células humanas.

Neste contexto, o conceito do que, exatamente constitui uma pessoa está novamente sob o microscópio, não apenas para os cientistas, mas para a cultura em geral. Durante séculos temos debatido quem é considerado uma pessoa e quando: é uma questão que domina o discurso político nos últimos séculos devido à ligação ao trabalho e à liberdade no mundo pós-renascentista.

Este projeto dá continuidade a um processo que se foca nestas questões e, em particular, analisa como estão vinculadas ao trabalho. Desde a industrialização, o modelo da fábrica evoluiu do trabalho humano, para o trabalho mecânico e, cada vez mais no século XXI, para a produção microbiana.

Atualmente, a vida não humana produz uma vasta gama de produtos, incluindo enzimas, alimentos, bebidas, matérias-primas, combustíveis e produtos farmacêuticos. Em alguns casos, os próprios micro-organismos são o produto final, noutros a sua respiração produz produtos, e por vezes são colhidos para darem origem a componentes, tais como sequências genéticas, anticorpos ou proteínas. Estes novos organismos vivem literalmente para trabalhar.

Estes novos processos industriais apontam para um aprofundamento da exploração da vida e dos processos vivos: design, engenharia, gestão e o aumento do grau de comodidade da própria vida.

Eu associo “fábricas” tanto às casas de trabalho dos livros de Dickens, do século XIX, como às fábricas neocoloniais em que os humanos trabalham até aos limites da sua força física e emocional para produzir bens materiais. A intenção do meu projeto é, paradoxalmente, produzir o cheiro desse trabalho humano como produto final, e não como subproduto ou desperdício supérfluo.

A premissa é que, ironicamente, lamentamos a perda de postos de trabalho na fábrica devido à terciarização da economia, e o cheiro desse trabalho é simultaneamente sinistro e sentimental.

ENG//

What does exploitation smell like? “Labor” is an art installation that fills a gallery with visual manifestation of the scent of people exerting themselves in stressful conditions.

This project poetically reflects and interrogates industrial society’s shift from human and machine labor to increasingly pervasive forms of microbial manufacturing, and in this process contemplates the changing borders defining what is to be human.

The smell of sweat is literally the smell of two species of bacteria that feed upon the excretions of the human body to produce the familiar acrid and sour scents. In this sense, the smell of labor is not actually a human scent, unless we are willing to redefine what constitutes a human.

This may come as a shock, since most people think that the way they smell is part of their own natural condition – put simply, your smell is your smell. But in fact it is far more complex: a cocktail of microorganisms that live on and in us are the culprits who determine that rather distinctive “human” feature. But it is arguably more than just whether we stink that is at stake: one recent study posits that “on average people have 182 species of bacteria living at any one time on their forearms, and about 8 per cent of these have never been formally described by scientists.” (The Independent, 2007).

Such findings about the vast numbers of creatures that live upon and in our bodies complicate any reductive sense of human-ness, since these cells vastly outnumber human cells and differ between persons far more than human cells do.

In this context, the idea what exactly makes up a person is again under the microscope, not just for scientists, but for culture at large. For centuries we have been debating who gets to be considered a person and when: it is a question that dominates political discourse of the last few centuries because of the connection to labor and liberation in the post-renaissance world.

My project is a continuation of a process that interrogates those issues and in particular looks at how they are tied to labor. Since industrialization, the factory model has shifted from human labor, to machine labor, and increasingly in the Twenty-first century to microbial manufacturing.

Today, non-human life produces of a wide range of products, including enzymes, foods, beverages, feedstocks, fuels and pharmaceuticals. In many cases, genetically modified new species have been invented for the specific product they produce. In some cases the microorganisms themselves are the end products, in other cases their respiration produces products, and sometimes they are harvested for components, such as genetic sequences, antibodies, or proteins.

They literally live to work. These new industrial processes point to a deepening of the exploitation of life and living processes: the design, engineering, management and commoditization of life itself.

I associate “factories” with both Dickensian, nineteenth-century workhouses, and neo-colonial sweatshops in which humans toil to the limits of their physical and emotional strength to produce material goods. The intent of my project is to paradoxically produce the scent of such human labor as an end product, rather than as bi-product or superfluous waste. The premise is that, ironically, we mourn the loss of factory jobs due to outsourcing and modernization and the scent of this labor is both ominous and sentimental.


BIO

PT//

Paul Vanouse é um artista que trabalha em novos Media emergentes. A sua prática é guiada por uma interdisciplinaridade radical e um amadorismo apaixonado. Desde o início dos anos 90 que o seu trabalho tem explorado assuntos complexos levantados por várias novas tecnociências, utilizando estas mesmas tecnociências como um medium. Os seus trabalhos têm incluído dispositivos de recolha de dados que examinam as ramificações da sondagem e categorização, experiências genéticas que comprometem as construções científicas de raça e de identidade, e organizações temporárias que criticam de forma lúdica a institucionalização e a corporização. Estas “Ficções Operacionais” são entidades híbridas – simultaneamente objetos reais e representações fantasiosas – com a intensão de ressoar no contexto hiper-real da paisagem eletrónica contemporânea.

ENG//

Paul Vanouse is an artist working in Emerging Media forms. Radical inter-disciplinarity and impassioned amateurism guide his practice. Since the early 1990s his artwork has addressed complex issues raised by varied new techno-sciences using these very techno-sciences as a medium. His artworks have included data collection devices that examine the ramifications of polling and categorization, genetic experiments that undermine scientific constructions of race and identity, and temporary organizations that playfully critique institutionalization and corporatization. These “Operational Fictions” are hybrid entities–simultaneously real things and fanciful representations–intended to resonate in the equally hyper-real context of the contemporary electronic landscape.